Posicionamento da instituição aponta problemas na saúde do coração e sociais gerados pelo uso de cigarros eletrônicos
A votação para o Projeto Lei 5.008/2023, que pretende permitir, com regras, a venda de cigarros eletrônicos no Brasil foi remarcada para o dia 3 de setembro, após ser adiada, no último dia 20, no Senado. O PL propõe uma regulamentação para produzir, vender, importar e exportar os aparelhos, que são também conhecidos como vapes ou pods. A votação será realizada após o Dia Nacional do Combate ao fumo, 29 de agosto. A Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) aproveita a data para reforçar sua preocupação e mantém sua posição contra a liberação.
No início do ano, a Sociedade Brasileira de Cardiologia lançou um posicionamento sobre os cigarros eletrônicos e seus efeitos nocivos. O documento cita 10 motivos para ser contra a comercialização do produto: fator de risco cardiovascular, prejuízos da saúde de fumantes e não fumantes, responsabilidade internacional do Brasil com o controle do tabaco, impactos financeiros para regularização e fiscalização, impacto financeiro no SUS para tratamentos, distanciamento do Brasil da politica antitabaco mundial, aumento de cigarros eletrônicos entre jovens e adolescentes, prevenir uma nova epidemia de tabagismo e evidências insuficientes como menor risco entre os fumantes.
“Existem riscos cardiovasculares comprovados com o uso desses dispositivos, como hipertensão arterial, arritmias cardíacas, aumento do stress oxidativo e aterosclerose arterial obstrutiva, além de maior probabilidade de infarto do miocárdio. Indivíduos que fazem uso habitual do cigarro eletrônico apresentam uma probabilidade 1,79 vez maior de ter infarto em comparação com não fumantes”, alerta o médico Ricardo Pavanello, representante da Sociedade Brasileira de Cardiologia.
Os adolescentes continuam sendo os principais usuários do produto. A Pesquisa Nacional de Saúde dos Escolares, conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizada com159.245 estudantes brasileiros, revela que a experimentação de cigarro eletrônico em algum momento da vida entre estudantes de 13 a 17 anos atingiu 16,8% (IC95% 16,2-17,4). Vale ressaltar que o uso de qualquer produto relacionado ao tabaco, englobando cigarros convencionais, vapes e outros, aumentou de 9% em 2015 para 12%, em 2019, entre adolescentes. Portanto, após duas décadas de declínio, a tendência entre adolescentes se reverteu, influenciada pelo uso de produtos como vapes e narguilé.
E os dados são cada vez mais alarmantes. Segundo a pesquisa Covitel 2023, um em cada quatro jovens, entre 18 e 24 anos, já experimentou cigarros eletrônicos, sendo seu uso 40 vezes mais comum na população abaixo dos 40 anos. Entre os usuários de cigarros eletrônicos, de 15 a 24 anos, 63% nunca experimentaram cigarro convencional, indicando que os vapes são atualmente a principal fonte de iniciação do ato de fumar no país.
“O documento, lançado pela SBC, indica que jovens que fazem uso de cigarros eletrônicos têm menor propensão a cessar o tabagismo. Já adultos fumantes que recorrem aos vapes exibem uma notável inclinação para a dupla utilização, que envolve cigarros eletrônicos e os tradicionais, o que aumenta os riscos à saúde”, aponta o cardiologista.
O posicionamento da instituição ressalta que o cigarro eletrônico não tem combustão, mas existem outros produtos, distintos daqueles do cigarro convencional, muitos dos quais com impactos desconhecidos na saúde humana. O Vape apresenta quatro partes principais: um reservatório, um dispositivo de aquecimento, uma bateria de lítio e um bocal. No reservatório, são alojados a nicotina e, por vezes, os aromatizantes, os solventes e outros componentes químicos. A presença de solventes e aditivos, aquecidos durante o funcionamento do dispositivo, pode originar componentes tóxicos provenientes tanto dos próprios cigarros eletrônicos quanto de seus líquidos. Os refis e os frascos de nicotina líquida não descartáveis representam um potencial risco de intoxicação, especialmente por ingestão acidental, absorção pela mucosa oral ou contato com a pele em caso de vazamento.
Desde 2019, o Food and Drug Administration (FDA) têm registrado um aumento nos casos de lesão pulmonar aguda grave associada ao uso de produtos de cigarro eletrônico ou vapes. A maioria dos pacientes diagnosticados com EVALI necessitou de hospitalização, sendo que muitos receberam cuidados intensivos e suporte respiratório. Notavelmente, 2,3% dos casos resultaram em óbito. O acetato de vitamina E, um aditivo ocasionalmente utilizado em produtos contendo tetra-hidrocanabinol (THC), está significativamente associado ao surto de EVALI. No entanto, as evidências disponíveis ainda não são suficientes para descartar a contribuição de outros produtos químicos preocupantes.