O Abril Azul é comemorado todos os anos como um mês dedicado à conscientização do autismo. Monumentos pelo Brasil e em todo o mundo são iluminados com a cor usada hoje para representar o espectro e diversas campanhas expõem conceitos básicos e dicas para evitar o capacitismo no dia a dia.
O autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento e, ao contrário de pessoas com outras síndromes, como a síndrome de Down, o autista não possui características que podem ser identificadas pelo olhar. Por isso, o autismo é considerado uma deficiência invisível e é comum autistas com baixa necessidade de suporte ouvirem a expressão: “nem parece autista”.
A frase é capacitista e equivocada justamente porque, além de não existirem características físicas que ajudam a identificar o autista, o autismo é um espectro, daí o termo médico Transtorno do Espectro Autista (TEA). Quando falamos em espectro, queremos dizer que nenhum autista é igual ao outro e que cada um vai representar a diversidade do transtorno de forma única. Ninguém “parece autista”. Apenas é.
Falta de compreensão tem um tremendo impacto sobre os autistas, suas famílias e comunidades, diz a ONU
Este tipo de pensamento prejudica especialmente o diagnóstico de pessoas com autismo de grau 1, também conhecido como autismo leve ou autismo de baixo grau de suporte. Como não correspondem a nenhum estereótipo, enfrentam mais dificuldades para serem diagnosticados, especialmente no caso das mulheres.
Hoje, sabe-se que a cada três meninos, apenas uma menina é diagnosticada com autismo, de acordo com dados do CDC (Centers for Disease Control and Prevention, Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA). O acesso a alguns direitos, como o atendimento preferencial, também se torna mais custoso aos autistas.
Para que estas e outras informações sobre o autismo e a rotina dos autistas pudessem ser popularizadas, a ONU (Organização das Nações Unidas) criou o Dia Mundial da Conscientização do Autismo, celebrado em todo o mundo no dia 2 de abril.
“A taxa de autismo em todas as regiões do mundo é alta e a falta de compreensão têm um tremendo impacto sobre os indivíduos, suas famílias e comunidades. A estigmatização e a discriminação associadas às diferenças neurológicas continuam sendo obstáculos substanciais ao diagnóstico e às terapias, uma questão que deve ser abordada tanto pelos formuladores de políticas públicas nos países em desenvolvimento quanto pelos países doadores”, informa a ONU.
Em 2023, comemoramos pela 16ª vez o Dia Mundial de Conscientização do Autismo
A criação da data foi registrada em dezembro de 2007 e aprovada durante a Assembleia Geral da ONU, em votação unânime, em janeiro de 2008, ano em que entrou em vigor a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, da qual o Brasil é um dos signatários.
A convenção reafirma o princípio fundamental dos direitos humanos universais. O objetivo é promover e proteger com igualdade e em sua plenitude, todos os direitos e liberdades fundamentais a todas as pessoas com deficiência, e respeitar sua dignidade. “É uma ferramenta vital para promover uma sociedade inclusiva e solidária para todos e para garantir que todas as crianças e adultos com autismo possam levar uma vida plena e significativa”, segundo as Nações Unidas.
O ano de 2023 marca, portanto, a 16ª celebração do Dia Mundial da Conscientização do Autismo. Na esteira da data, todo o mês de abril passou a ser dedicado ao tema.
Ativistas autistas criticam uso exclusivo da cor azul para representar o espectro
Assim como em qualquer comunidade, a formada por autistas e seus familiares expressam múltiplas linhas de pensamento. Desde o início do século 21, vem se fortalecendo o ativismo protagonizado por autistas, especialmente pelos de grau 1. No Brasil, essa comunidade tem entre seus expoentes: Willian Chimura, Luciana Viegas, Tiago Abreu, Tabata Cristina, Polyana Sá, Gian Martinovic (que também atende por Gia ou Giulia), Lucas Pontes e muitos outros autistas, ativos especialmente nas redes sociais.
Neste contexto, há uma série de críticas apresentadas ao Abril Azul. Ativistas autistas defendem, por exemplo, o uso de um símbolo com a forma do infinito, que englobe todas as cores do arco-íris para lembrar a diversidade não só do autismo enquanto espectro, mas da diversidade de raça, identidade de gênero e sexualidade. Segundo esses ativistas, há uma necessidade de enxergar o autista para além de um estereótipo que ainda hoje está muito ligado a uma figura branca, masculina, heteronormativa, pura e infantil.
Não há dados oficiais, por exemplo, de diagnóstico entre autistas adultos, embora venham se tornando cada vez mais comuns. Até mesmo na terceira idade eles vêm se tornando cada vez menos raros, como foi o caso do ator Anthony Hopkins, que soube que era autista após os 70 anos.
Os ativistas autistas brasileiros também fazem críticas constantes ao conceito de anjo azul, adotado principalmente por pais de autistas com maior grau de suporte e um dos temas mais sensíveis dentro da comunidade. O apresentador de TV Marcos Mion, pai de autista e expoente mais popular da comunidade, é adepto da expressão, enquanto ativistas autistas preferem que não seja utilizada.
Polêmicas à parte, o Abril Azul e o Dia Mundial da Conscientização do Autismo ainda são fontes de informação e conhecimento sobre o transtorno, que atualmente está presente em uma em cada 44 crianças, de acordo com os dados mais recentes do CDC. É preciso que essas crianças tenham acesso a diagnóstico, educação e todos os recursos que garantam, dentro do potencial máximo de cada um, sua autonomia, independência e felicidade.
Fonte Autismo e realidade