Como Surge um Novo Vírus?

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Em meio a atual pandemia da Covid-19, cresce o número de pessoas interessadas em saber como surge um novo vírus ou de onde vem uma nova doença. Muitas vezes, essas perguntas dão origem a várias teorias da conspiração rapidamente disseminadas pelas redes sociais. A hipótese de que o vírus tenha sido gerado em laboratório é um exemplo, e já foi negada em um trabalho feito por cientistas dos Estados Unidos, Reino Unido e Austrália.

Indo na direção contrária, apresentamos a seguir as principais informações sobre este tema, trazidas pela história e pela ciência, para que você esteja bem informado(a) nas conversas que tiver sobre isso.

As epidemias ao longo da história

Há relatos de epidemias que devastaram populações inteiras desde as épocas mais longínquas. Para citar somente algumas: em 428 ac, estima-se que a Peste de Atenas possa ter matado até um terço dos atenienses, na época envolvidos com a Guerra do Peloponeso. No século II dc, foi a vez da Peste Antonina devastar Roma, vitimando inclusive o imperador Marco Aurélio.

No séc. XIV, a Peste Negra, uma das mais famosas da história, levou à morte cerca de um terço da população europeia. No início do séc. XX, a Gripe Espanhola se alastrou pelo mundo todo, deixando para trás um número de mortos que, nas estimativas mais pessimistas, teria chegado à cifra dos 100 milhões – mais do que a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais juntas.

Hoje estamos lidando com uma pandemia que teve seu início na cidade de Wuhan, na China, e que percorreu todos os continentes em menos de 3 meses. Trata-se de uma epidemia de origem viral, causada por um novo tipo de coronavírus batizado pelos cientistas como SARS-CoV-2. A doença associada a ele foi nomeada Covid-19.

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É importante lembrar que nem toda epidemia resulta de um vírus. A Peste Negra e a tuberculose, por exemplo, foram provocadas por bactérias. Além disso, desde o século passado, os epidemiologistas trabalham com um conceito de epidemia que abrange também doenças crônicas não transmissíveis, como as doenças cardíacas e o câncer.

Mas afinal, como surge um novo vírus?

Não se sabe ao certo como surgiu o primeiro vírus. É possível que tenha se originado de uma molécula de RNA – como sugere a “Teoria dos Elementos Subcelulares” – ou então que, através de um longo processo, seres unicelulares tenham perdido várias de suas estruturas, até o ponto em que se tornaram inteiramente dependentes de outra célula para sobreviverem.

De todo modo, é esta a característica principal de um vírus: ele é um parasita obrigatório, ou seja, sobrevive e se reproduz somente se conseguir encontrar uma célula hospedeira com a qual possa se ligar. Contudo, isso não ocorre sempre. Pelo contrário, na maior parte das vezes, um vírus simplesmente desaparece sem nunca se ligar a ninguém.

Especula-se que, no início do século XX, uma ave contaminada e um homem gripado possam ter se encontrado com um mesmo porco. O vírus da ave não podia infectar o homem, mas conseguiu contaminar o porco, um animal que, como se descobriu anos depois, pode ser infectado por ambos os vírus – os da “gripe humana” e os da “gripe aviária” também.

É possível que tenha sido a partir deste encontro triplo que o vírus responsável pela gripe espanhola surgiu: o Influenza A H1N1, uma recombinação do vírus da gripe aviária, suína e humana que, como se viu, foi bastante eficaz em infectar células humanas. Inclusive, se o nome do vírus lhe soa comum, é porque foi uma variação do mesmo Influenza A H1N1 que tornou a nos assustar quase um século depois, em 2009, com a pandemia da gripe A (ou gripe suína, como ela ficou mais conhecida).

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Em 2003 foram os morcegos que entraram em evidência, suspeitos de serem o reservatório do vírus de uma nova doença que vinha causando altas taxas de mortalidade por onde passava. Rastreando-se seu local de origem, foi possível chegar à província de Guangdong, no sudeste da China, onde, no final de 2002, algumas pessoas foram internadas com uma pneumonia atípica. Tratava-se da Síndrome Respiratória Aguda Grave (ou, na sigla em inglês, SARS), provocada por um tipo de coronavírus até então desconhecido, batizado como SARS-CoV.

A gripe espanhola, a SARS e a atual Covid-19 são exemplos daquilo que chamamos de doenças zoonóticas, isto é, doenças infecciosas cuja transmissão aos seres humanos se dá, inicialmente, através de um animal.

Estima-se que, a cada 10 doenças infecciosas que acometem os seres humanos, 6 sejam zoonóticas e que, dentre estas, cerca de 70% sejam provocadas por animais selvagens. Este é um ponto especialmente caro à China, que tem sua história associada a um – cada vez mais polêmico – comércio da vida selvagem.

Em 2002 os primeiros pacientes da SARS eram quase todos comerciantes de um mercado úmido da cidade de Shenzhen, na província de Guangdong. Esse tipo de mercado é caracterizado, principalmente, por ser um ponto de comércio de dezenas de espécies de animais selvagens, vendidos vivos ou mortos na hora.

Quando foi comprovada a ligação entre o coronavírus da SARS e a carne vendida no mercado de Shenzhen, este foi fechado, e o comércio de animais selvagens foi temporariamente banido. Bastaram seis meses para tornarem a legalizá-lo.

De fato, 17 anos depois, outro mercado úmido, agora na cidade de Wuhan, seria apontado como berço do novo coronavírus, o SARS-CoV-2. Novamente, os morcegos são apontados como os prováveis reservatórios do vírus. Os pangolins, comercializados nesse mercado, aparecem como possíveis intermediários – ou seja, como aqueles que teriam mediado a passagem do vírus do morcego até os primeiros humanos infectados.

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Em decorrência disso, o comércio de animais selvagens foi temporariamente banido em 26 de janeiro. Com a escalada da doença, no entanto, uma nova legislação foi aprovada, e no dia 24 de fevereiro o comércio e consumo de animais selvagens criados no campo ou em cativeiro foram permanentemente banidos.

É importante saber que quanto maior for a aglomeração e circulação de pessoas, maior também a chance de que a nova doença provoque uma pandemia. É por isso que, a despeito dos importantes progressos da medicina nos últimos séculos, é cada vez maior a probabilidade de que novas pandemias voltem a balançar o mundo, e é, também, cada vez mais difícil contê-las antes que se espalhem por todo o globo.

Referências: Epidemiologia Básica (OMS), As grandes Epidemias da História, World Animal Protection, Reuters, Ligas Neidimila Aparecida Silveira Oliveira e Aparecida Maria Iguti (Vírus Influenza H1N1 e os trabalhadores da suinocultura) e Prof. Dr. Paulo Michel Roehe (Curso de Virologia Básica)

 

 

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