O que é curtailment e por que esse é o novo pesadelo do setor elétrico?

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Um dos maiores desafios das usinas eólicas e solares em operação no Brasil tem um nome pomposo em inglês: curtailment.

Explicamos: a cada instante, o operador do sistema precisa despachar o parque de geração em um volume exatamente igual à demanda. O grande aumento da participação das fontes eólica e solar na matriz elétrica traz muitos desafios na operação do sistema.

Há momentos do dia, por exemplo, em que há bastante sol ou vento, situação em que essa geração renovável até excede a demanda do submercado nordeste – o que leva o operador do sistema a precisar desligar diversas plantas solares e eólicas (e hidrelétricas também).

Outro exemplo é a situação comum ao final do dia, em que a geração solar cai abruptamente. Para que a demanda permaneça atendida, pode ser necessário despachar usinas hidrelétricas e termelétricas antes mesmo da queda da geração solar – o que também leva o operador a precisar desligar usinas solares e eólicas.

Todas essas restrições operativas visam atender de forma adequada e confiável as necessidades da carga. O efeito colateral dessas restrições é a redução da geração de usinas eólicas e solares, também chamado de curtailment ou constrained off – ou em bom português: cortes de geração.

O arcabouço regulatório para o tratamento desses cortes encontra-se atualmente definido na Resolução Normativa 1.030/2022 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A resolução define três tipos de cortes:

  1. Cortes por razão de indisponibilidade externa (tipo REL): motivados por indisponibilidades em instalações externas à usina – tipicamente indisponibilidade do sistema de transmissão;
  2. Cortes por razão de atendimento a requisitos de confiabilidade elétrica (tipo CNF): motivados por razões de confiabilidade elétrica dos equipamentos pertencentes a instalações externas à usina; e
  3. Cortes por razão energética (tipo ENE): motivados pela impossibilidade de alocação de geração de energia na carga.

Embora as três modalidades configurem cortes impostos pelo operador do sistema, só há ressarcimento pela energia não gerada quando o evento é classificado como indisponibilidade externa (ou seja, indisponibilidade da rede de transmissão).

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A resolução também define contornos temporais e contratuais (se o contrato foi firmado no Ambiente de Contratação Regulada ou no Ambiente de Contratação Livre) para esse ressarcimento, que se dá por meio do Encargo de Serviço de Sistema pago por todos os consumidores de energia (livres e regulados).

Para se ter uma ideia, a média de cortes de geração das usinas solares localizadas no submercado Nordeste saltou de 4,8% no mês de abril para 34,8% no mês de setembro. Para as eólicas do Nordeste, a média dos cortes saltou de 2,2% em abril para 18,1% em setembro.

O destaque fica para o incremento dos cortes tipo CNF que saltaram de 1,3% (abril) para 12,6% (setembro) para as eólicas e de 1,9% (abril) para 20,5% (setembro) para as solares.

A redução de geração de usinas eólicas e solares impactam as empresas de duas formas: (i) aumento da exposição ao Mercado de Curto Prazo (MCP), que é valorada ao Preço de Liquidação de Diferenças (PLD) de cada momento em que acontece o corte, e (ii) degradação da garantia física, que é revisada anualmente com base na geração média verificada, mas encontra-se atualmente suspensa.

A FSET realizou uma estimativa do aumento da exposição ao MCP causada pelos cortes ocorridos em 2024. As usinas eólicas do país tiveram um impacto de cerca de R$ 711 milhões desde janeiro de 2024. Já as solares foram impactadas em aproximadamente R$ 165 milhões desde abril de 2024.

O impacto financeiro dos cortes saltou em 125% de agosto para setembro, tendo em vista que o PLD médio ficou em R$ 280,00/MWh.

Todos os cálculos aqui apresentados foram elaborados pela FSET utilizando bases de dados abertos disponibilizada pelo Operador Nacional do Sistema (ONS) e pela Câmara Comercializadora de Energia Elétrica (CCEE) e metodologia proprietária para análise dos cortes.

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A conclusão é que a operação mais desafiadora devido à inserção de renováveis não controláveis, bem como o excesso de oferta (centralizada e de micro e mini geração distribuída) em relação à demanda tem causado incremento expressivo nos cortes de geração. Esse cenário tende a se agravar, considerando-se a perspectiva de mais usinas eólicas e solares entrando no sistema.

Os proprietários de usinas eólicas e solares têm buscado equacionar os impactos financeiros por vias administrativas e judiciais. O epílogo desta história provavelmente culminará em mais disputas judiciais, como aconteceu no passado recente do GSF – o curtailment das usinas hidrelétricas.

Opnião do Engenheiro Eletricista e CEO da ENERCONS Ivo Pugnaloni:

Para o CEO da ENERCONS, engenheiro eletricista Ivo Pugnaloni, a carga no sistema elétrico que essa nova unidade industrial vai acrescentar não poderá ser sustentada por geração solar, altamente influenciada por dias nublados, chuvosos e pelo inexorável horário depois das 16 horas, quando o sol vai se pondo.  “Só fontes hidrelétricas ou termelétricas podem suprir cargas como essa, pois são permanentes. Resta saber se o Ministério de Minas e Energia vai preferir gerar energia elétrica com água nacional, ou com derivados de petróleo importados, caríssimos e poluentes” comentou.

Pugnaloni lamentou estar ainda paralisada nas assessorias do MME , há três anos, a precificação das externalidades ( benefícios e prejuízos adicionais ao meio ambiente) de cada fonte. “Talvez seja a ação dos poderosos “lobbies”  aos quais se referiu o próprio ministro Silveira na sua excelente entrevista à CNN, semana passada”, disse o executivo que foi diretor de planejamento da COPEL , concessionária do Paraná.

“Não há como negar que as assessorias do MME estarão fazendo o governo incorrer em grave risco de judicialização caso o Leilão de Reserva de Capacidade não venha a atender ao artigo 26, parágrafo 1-G que determina que todos os benefícios ambientais e de garantia de fornecimento sejam considerados, nos certames como esse, que envolvem centenas de bilhões de reais em energia elétrica, disse ele.

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“Vejam leitores o que diz a Lei 9784/99 Art. 26 § 1º-G. “O Poder Executivo federal definirá diretrizes para a implementação, no setor elétrico, de mecanismos para a consideração dos benefícios ambientais, em consonância com mecanismos para a garantia da segurança do suprimento e da competitividade, no prazo de 12 (doze) meses, contado a partir da data de publicação deste parágrafo. Se isso não aconteceu, o MME corre o risco de um mandado de segurança interromper todo esse processo de compra enorme, pois a data de publicação deste parágrafo foi 01.03.21. E quem aviusa, geralmente, amigo é”, adendou.

“O atual governo brasileiro precisa entender, de uma vez por todas, que não basta geração solar e eólica para fazer a transição energética, pois elas são fontes intermitentes. Param de uma hora para a outra de produzir. Essas duas fontes são muito boas, mas tem esse grave defeito. Sem novas hidrelétricas para completar a geração faltante da solar e eólica a cada momento, a nossa matriz vai ter que usar cada vez mais termelétricas que já são, graças às manobras desses lobbies, mais de 37% da capacidade instalada do Brasil”, concluiu preocupado Ivo Pugnaloni.

 

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