Acordou, colocou os dois pés no chão, fechou os olhos, inspirou, expirou, inspirou, expirou. A principio sentiu faltar oxigênio no cérebro e um rápido mal estar. Inspirou, respirou, se olhou e foi se arrumar.
Rotineiramente costuma sair de casa com um checklist mental de tudo que precisa comprar, arrumar, fazer, ligar. Dessa vez estava estranha. Passou pela padaria e não sentiu vontade de comer um doce. Passou pelas vitrines da Alameda das Grifes, achou tudo lindo, mas não desejou parar para experimentar.
Chegou no trabalho e se lembrou de todas as pendências, mas sem a boa e velha dor nas costas, começou a solucionar.
Recebeu e-mail das promoções, mas não se interessou em gastar. A amiga chegou fazendo propaganda de um produto novo, se interessou em conhecer, mas nem passou pela sua cabeça comprar.
Estava estanha. A mente estava quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo.
Depois de um dia exaustivo chegou em casa e encontrou a louça suja, o marido ocupado e as crianças brigando. Em outros tempos, daria um berro, colocaria os meninos de castigo e iria ver as promoções virtuais. Hoje, porém, inspirou, respirou, chamou as crianças de lado, abraçou, inspirou, respirou, deu um beijo no marido e convocou todo mundo a ajudar.
De olhos arregalados ninguém entendia. Trocaram nossa mãe, pensou o menino. O marido ficou quieto. Quando a esmola é demais, até o santo desconfia. Ela se lembrou de uma música que gostava de ouvir quando começaram a namorar, ligou o som, contou a história para os filhos e começaram a sorrir.
Naquele dia não teve vazio. Não teve ansiedade e inquietação. Teve leveza e um dia nada comum. Na hora de dormir, alguém sussurrou no seu ouvido: Essa é a riqueza da vida simples.